Uma rede internacional de manipulação de resultados interfere em amistosos de clubes romenos na Turquia e no Chipre

Reportagem: Razvan Lutac, Sebastian Culea e Costin Stucan publicada no site da Gazeta Sporturilor nesta terça-feira
Tradução e adaptação: João Vítor Roberge –
O Craiovano

Em agosto de 2014, um singapurano concede uma entrevista exclusiva para a CNN, contando que manipulou entre 80 e 100 jogos de futebol no mundo todo. Há cerca de um ano, foi solto da prisão. O homem, de nome Wilson Raj Perumal, é o membro mais importante da máfia asiática de apostas que já foi preso uma vez.

Por consequência de suas interferências no futebol, dezenas de jogadores e árbitros foram suspensos. De acordo com suas testemunhas, Perumal manipulou jogos das Olimpíadas, de Copa das Nações Africanas, de eliminatórias para a Copa do Mundo e na Copa do Mundo de futebol feminino. “Minha taxa de sucesso foi entre 70 e 80%”, disse o asiático à CNN na época.

Preso na Finlândia, onde subornou 11 jogadores com um total de 470 mil euros, Perumal ficou detido durante um ano, até ser extraditado para a Hungria.

Após de outros 12 meses passados atrás das grades na Hungria, o singapurano começou a cooperar com as autoridades europeias. Uma vez solto, Perumal se casou e ficou na cidade húngara de Debrecen. Escreveu um livro, de nome “Kelong Kings”, no qual descreveu uma parte de suas experiências.

Como Perumal manipula em Antalya: Muitos pênaltis

Os repórteres da Gazeta Sporturilor entraram em contato com Wilson Raj Perumal há meses.

Na sexta-feira (27), depois que a Gazeta Sporturilor publicou o primeiro episódio da investigação  “Árbitros disfarçados por apostas” e após a tradução inglesa feita pelo blog Futbolgrad, o ex-manipulador de resultados recebeu o link da reportagem. Leu e assistiu aos melhores momentos de cada partida.

O tema dos amistosos da cidade turca de Antalya lhe é extremamente familiar.

Na sua carreira, Perumal atuou várias vezes como organizador de jogos, realizando amistosos inclusive em Antalya. Através de duas empresas de fachada, FootyMedia e Football4U, Perumal trouxe árbitros e subornou dirigentes para manipular as partidas entre Bolívia e Letônia e Estônia e Bulgária [nota d’O Craiovano: Bolívia 1×2 Letônia e Estônia 2×2 Bulgária em 9 de fevereiro de 2011].

Disputados em fevereiro de 2011, os dois jogos internacionais contém momentos que se parecem demais com o que aconteceu em quatro jogos suspeitos disputados por clubes romenos neste inverno [no hemisfério norte] e apitados pela rede de Dambovita! [nota d’O Craiovano: “rede de Dambovita” é um grupo de romenos da Associação de Futebol do distrito de Dambovita que falsificou nacionalidades para apitar e manipular estes amistosos de times romenos]

Nos jogos arranjados por Perumal e seus associados, todos os sete gols foram marcados de pênalti, e um dos árbitros mandou voltar um dos pênaltis depois que o cobrador havia perdido [nota d’O Craiovano: Na semana passada, o lateral Cristian Sapunaru, do Astra, perdeu um pênalti de propósito contra o Pogon Szczecin da Polônia, e o árbitro mandou voltar. Deste vez, o atacante Daniel Niculae isolou a bola, também por não concordar com o pênalti]

Em 2017, os árbitros Cristian Catana e Dan Petre inventaram sete pênaltis em quatro jogos. Três deles, em Astra 1×3 Pogon, Botosani 3×0 Amkar e CFR Cluj 2×0 FC Ufa, foram repetidos a mando dos árbitros. Além disso, nos seus jogos, Petre deu seis minutos de acréscimo no primeiro tempo sem motivo algum.

Quem está por trás destes árbitros romenos que tomaram decisões inacreditáveis em campo?

Por que os finlandeses não querem jogadores romenos

A resposta de Wilson Raj Perumal a esta pergunta dos repórteres da Gazeta foi “os sindicatos de crime organizado”.

Repórter: Como se entra em contato com estes sindicatos?
Perumal: As pessoas têm seus métodos…
Repórter: Um dos árbitros esteve em dezembro em Singapura…
Perumal: Com os romenos é muito fácil!

Repórter: Por que diz isto?
Perumal: É a crise econômica.

Repórter: É o único motivo?
Perumal: Em alguns países, como a Finlândia, os jogadores romenos não conseguem jogar.

Repórter: Por quê? Os finlandeses têm medo?
Perumal: Sim, têm medo de ter jogos manipulados. Falta integridade aos romenos. Lamento te dizer isto, mas esta é a opinião no futebol.

A Lista dos agentes que levaram os árbitros de Dâmbovita

Os árbitros de Dâmbovita foram para Antalya em grupo e distribuídos pelos agentes organizadores de jogos, papel que era cumprido por Perumal no passado.

A Gazeta identificou muitos agentes responsáveis pela distribuição dos árbitros de Dâmbovita nas partidas dos clubes romenos. Eles são o cipriota Antonis Antoniou (amigo dos irmãos Becali e de Dan Petrescu) [nota d’O Craiovano: os irmãos Becali são empresários de futebol. Gigi Becali, um dos irmãos, é dono do Steaua/FCSB. Dan Petrescu é ex-lateral do Chelsea e da seleção romena], o moldavo Anatolii Șarpe e o misterioso turco conhecido por “Yusuf”. Outros agentes que trazem árbitros são Cristian Voicu, afilhado da família Reghecampf [nota d’O Craiovano: a família Reghecampf é famosa no futebol romeno. Laurentiu Reghecampf é ex-jogador e atual técnico do Steaua, e sua esposa, Anamaria Prodan-Reghecampf, é empresária de diversos jogadores], e seu associado, o turco Ilengiz Gurel.

Estes últimos dois transferem entre si a responsabilidade de ter trazido a Antalya, em 2014, alguns árbitros macedônios que são citados por promotores da Singapura num processo ligado à manipulação dos jogos Steaua x Sturm Graz, da Áustria, Steaua x Dinamo Moscou e Charleroi-BEL x VVV Venlo-HOL.

Singapura, onde nasceu Perumal, é um nó importante da máfia das apostas. Para lá foi Dan Petre, árbitro de Târgoviste, capital de Dambovita, que não está em sua primeira passagem por amistosos em Antalya.

Quatro dias depois de ter se recusado a falar com a imprensa, Petre respondeu nesta segunda-feira à Gazeta e exigiu que os jornalistas divulgassem suas fontes: “Estou difamado e quero processar as fontes. Minha profissão é professor e não me convém que o diário de vocês me difame. Se vocês não me falarem as fontes, é vocês quem vou processar”.

Petre é o único dos árbitros no caso que contratou um advogado.

A ironia de Petre: “talvez eu tenha uma herança”.

Perguntado pelos repórteres se esteve em Singapura, Petre respondeu, contrariado: “eu visito muitos países. É problema meu onde vou no meu tempo livre”.

Petre esteve na Ásia apenas por quatro dias. Saiu em 20 de dezembro de 2016 e voltou no dia 24, em plena véspera de Natal. O voo, com escala em Doha, dura 15h.

Na prática, Singapura significou para o professor de natação de Târgoviste apenas uma escala mais longa entre dois voos saindo e chegando em Bucareste.

A passagem de avião mais barata custa 650 euros.

De acordo com as fontes da Gazeta, o árbitro distrital Dan Petre tem duas fontes de renda conhecidas: a arbitragem, com 11o leus (aprox. R$ 83), e as aulas de natação, aproximadamente 1,2 mil leus (aprox. R$ 910) por mês.

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O árbitro Dan Petre apita amistoso do Botosani neste ano. A Gazeta Sporturilor afirma que ele6 mil euros de uma máfia de apostas para manipular o jogo (foto: GSP)

“Talvez eu tenha muitas heranças. Talvez minha família tenha outras fontes de renda”, respondeu Petre, quando perguntado sobre a viagem a Singapura.

É o mesmo Petre que, no ano passado, confessou a pessoas próximas que recebeu 6 mil euros em apenas alguns dias, enquanto estava em Antalya.

O árbitro nega, ainda, qualquer envolvimento em negócios sujos: “Eu não tenho nada a ver com isso…”

As manipulações encareceram

A Gazeta perguntou a Wilson Raj Perumal quanto dinheiro um árbitro pode ganhar se ficar duas semanas nos amistosos de Antalya. “Faz entre três e 5 mil euros”, afirma o ex-manipulador de jogos.

É possível que Perumal tenha se lembrado dos preços de quando estava na ativa. No caso dos jogos do Steaua de 2014, os três árbitros macedônios envolvidos receberam no total 42 mil euros. O dinheiro foi lev

Trio romeno apitando Astra x Pogon: Um show de pênaltis-fantasmas (foto: GSP)
Trio romeno apitando Astra x Pogon: Um show de pênaltis-fantasmas (foto: GSP)

ado a Antalya através de um intermediário de Singapura e entregue no hotel no qual os árbitros estavam hospedados.

“Se você for para Antalya na época de preparação dos times, vai se assustar com a quantidade de hotéis. Lá estão todo tipo de árbitro que vão oferecer serviços, de jogadores que se oferecem a clubes, você vê todo tipo de indivíduo duvidoso. É como uma feira, só que tudo acontece em hotéis cinco estrelas. Os árbitros vão lá pelo dinheiro de agentes de jogos e são usados em diferentes partidas”, conta um ex-investidor da Liga I que não quis se identificar.

Uma parte do depoimento acima é confirmada por Razvan Nedelcu, um dos assistentes de arbitragem envolvidos. “A hospedagem e todos os custos são por conta deles. Tive tudo pago”.

Eles quem?

“Não conheço. Não fui atrás dos detalhes”, respondeu o árbitro de apenas 21 anos.

Nos próximos dias, a Gazeta Sporturilor vai trazer novos nomes de árbitros envolvidos na rede de Dambovita e novas provas do envolvimento de pessoas que negaram ter ligação com os jogos suspeitos de Antalya.

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